quinta-feira, 21 de maio de 2015

Silêncio e intimidade estão cada vez mais raros

Uma era com excesso de exposição. As pessoas tem medo da solidão e de se encontrar consigo mesmas. Dificuldade em "não fazer nada e a sensação de vazio". Conflitos, problemas e desafios fazem parte da vida. Privacidade e silêncio estão diminuindo em nossa sociedade e cultura. A parafernália tecnológica aproxima distantes e afasta os próximos. Vale a pena se auto-avaliar e refletir




Alguns estudiosos do comportamento do ser humano contemporâneo vêm declarando, com bastante ênfase, que o nosso precioso silêncio, bem como a tão cara e necessária intimidade, se tornaram verdadeiros produtos de luxo em uma sociedade que se considera “pós-moderna”.

Segundo o escritor inglês, de origem indiana, Pico Iyer, que tem rodado o mundo em busca de um ritmo de vida ideal, “temos nos dias atuais tanta informação e aceleração em nossas vidas, que acabamos conseguindo tudo, exceto paz.”

Complementa seu pensamento afirmando que “à medida que conquistamos dispositivos para economizar tempo, há menos tempo disponível. E, quanto mais rápido for o ritmo, mais precisaremos de tranquilidade, atenção e gentileza.”

Ele tem sua base fixa no interior Japão, e afirma que não tem carro, celular nem TV. O que lhe permite – segundo seu depoimento – desfrutar mais dos dias, com a sensação de que o tempo parece durar mais, além da chance de não fazer nada. “Um verdadeiro luxo nos dias atuais” conclui.

É interessante observar que vivemos uma época em que muitas pessoas tem medo de ficar sós – o que é diferente de solidão -, e até mesmo preservar sua intimidade. Além disto dedicam cada vez menos tempo ao processo reflexivo, ou de se encontrar consigo próprio.

Buscam a felicidade como um estado “permanente” especialmente para demonstrar aos outros - de formas cada vez mais instantâneas - tudo que estão fazendo, desfrutando ou pensando. E para tanto criam personagens fictícios que carecem ou necessitam de admiração, inveja ou buscando se tornar referências no seu círculo de relações puramente virtuais.

Abominam a idéia do fracasso, receios, insegurança, incertezas, dor ou dúvidas. Valorizam as ferramentas da auto-ajuda, busca do sucesso e do otimismo permanente.

Segundo o psicanalista Leopoldo Nosek, “cada vez mais pessoas possuem uma dificuldade de olhar para sua interioridade. São pessoas que estão sempre em ação, impedindo o contato com o mundo onírico. Outros ainda têm uma cegueira para o que é conflitivo, contraditório e escuro.”

Prossegue dizendo que “viver feliz é um sonho infantil. A idéia de não ter conflitos, problemas, é uma negação da realidade. Isso não é viver feliz, é ter uma anestesia para uma parte da vida. Uma pessoa que acredita nisso não vive a crise dos filhos, as questões amorosas, os lutos. Pensa em soluções. Chamo essas pessoas de “solucionáticas”.

Uma outra experiência digna de nota em relação a forma de encarar a vida no que se refere ao tempo, rapidez, sensações, capacidade de observação e aprendizado, é a do jornalista italiano Tiziano Terzani, como correspondente no continente asiático, em seu instigante livro “Um adivinho me disse”.

Alertado por um adivinho de Hong Kong, para que no ano de 1993 não viajasse de avião, pelos riscos que iria correr, ele decidiu usar os demais meios de transporte, como trem, navio, ônibus, carro, bicicleta e alguns dias até a pé.

Segundo ele descreve, “quando alguém finge, por algum tempo, ser cego, descobre que, para compensar a falta de visão, todos os outros sentidos se afinam. A renúncia ao avião tem um efeito semelhante: o trem, com suas comodidades de tempo e descomodidades de espaço, faz renascer a desusada curiosidade pelos particulares, apura atenção por aquilo que escorre fora da janela. Nos aviões logo se aprende a não olhar, a não escutar. A gente que se encontra é sempre a mesma, as conversas que surgem são previsíveis. Ou seja, o quanto sendo um cômodo redutor de distâncias, acabam por reduzir tudo – inclusive a compreensão do mundo.”

Conclui ele que “tudo ficou tão fácil hoje que não se prova mais prazer por nada. Entender algo é uma alegria, mas somente se há esforço.”

Enfim, o desejo é que estas provocações façam o leitor refletir sobre a sua vida num sentido pleno e muito de acordo com a fase que está vivendo. De forma mais objetiva, a se apropriar dos seus sonhos, aspirações e projeto de vida. Cada vez menos o fazendo em função dos “outros”.

Afinal, vivendo mais, teremos que nos reinventar mais vezes. E este é um novo desafio que torna o viver mais digno e interessante.



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