O empresário, em geral, é bastante intuitivo com relação aos
riscos envolvendo seu negócio. Em todas as suas decisões há sempre, em algum
grau, considerações sobre as probabilidades de acerto ou de erro de seus
resultados. Logicamente, os resultados esperados são traduzidos pelo lucro das
operações em cada período medido, que, em última análise, representa o
autofinanciamento da sobrevivência de sua empresa.
A relação do lucro com os investimentos realizados dá a
medida do retorno pelo qual o empresário assumiu tantos riscos. Tanto em termos
absolutos quanto relativos, o retorno guarda relação direta com os riscos
assumidos. No sentido mais amplo, risco pode ser definido como a possibilidade
de perda financeira. Toda decisão, portanto, exige do empresário considerações
sobre o risco esperado para um retorno esperado. O risco do negócio pode ser
definido como a incapacidade para cobrir os custos operacionais. Corre-se o
risco financeiro quando o lucro não é suficiente para cobrir os custos
financeiros. A alavancagem combinada pode ser considerada como o impacto total
dos custos fixos na estrutura operacional e financeira da empresa. Nesse
sentido, toda a empresa é alavancada em algum grau e disso dependem os níveis
de risco e retorno para seus proprietários.
É interessante notar que muitos empresários que se declaram
aversos ao risco e que são caracteristicamente conservadores e defensivos em
suas decisões conduzem os seus negócios através da constituição e manutenção de
pesadas estruturas organizacionais, com elevada incidência de custos fixos. Sua
aversão é, na verdade, apenas ao risco financeiro. Isso é explicado porque
esses mesmos empresários costumam compensar quedas de vendas com uma
substancial redução de custos fixos, principalmente com expressivos cortes de
pessoal. E muitas vezes chamam isso de downsizing.
Estamos particularmente interessados no grau de aversão ao
risco financeiro, isto é, no grau de alavancagem que o empresário está disposto
e preparado para imprimir ao seu negócio pela obtenção de fontes de
financiamento de curto e longo prazos a terceiros. Não há dúvida de que o risco
financeiro é o mais temido, sob várias alegações: altos juros nominais,
distorções do sistema financeiro, exploração dos bancos, entre outros.
Uma das armadilhas mais intrigantes atende pelo nome de
"efeito tesoura" e teve seu conceito desenvolvido por Michel Fleuriet
e equipe, publicado no livro A Dinâmica Financeira das Empresas Brasileiras, em
co-edição da Consultoria Editorial Ltda. e da Fundação Dom Cabral, Belo
Horizonte, 1980. O conceito de "efeito tesoura" traz em seu bojo
outros conceitos revolucionários para uma adequada sistematização da
alavancagem financeira de uma empresa, principalmente levando-se em conta os
empréstimos de curto prazo.
Fleuriet acrescentou ao clássico conceito de Capital de Giro
Líquido (CGL) os conceitos de Necessidade de Capital de Giro (NCG) e Saldo de
Tesouraria (T). Para tanto reclassificou os grupos de contas do passivo
(fontes) e do ativo (aplicações) conforme a realidade dinâmica das empresas, em
que as contas relacionam-se ao mesmo tempo, o que lhes confere estado de
permanente movimentação.
Algumas contas, quando analisadas isoladamente ou em relação
ao conjunto de outras contas, apresentam movimentação tão lenta que podem ser
consideradas como "permanentes ou não-cíclicas". Outras, em
contrapartida, apresentam movimento "contínuo e cíclico", bem de
acordo com o ciclo operacional da empresa. Existem outras, finalmente, que
apresentam movimento "descontínuo ou errático", em nada ou quase nada
se relacionando com o ciclo operacional.
No sentido financeiro clássico, o Capital de Giro Líquido
(CGL) define-se como: CGL = ativo circulante – passivo circulante. Já a
Necessidade de Capital de Giro (NCG) é definida pela expressão: NCG = ativo
cíclico – passivo cíclico.
Na maioria das empresas, as saídas de caixa ocorrem antes
das entradas de caixa. Essa situação cria uma necessidade de aplicação
permanente de fundos, que se evidencia no balanço por uma diferença positiva
entre o valor das contas cíclicas do ativo e das contas do passivo. Essa
diferença entre as contas cíclicas é que se denomina NCG.
Importante ressaltar que a Necessidade de Capital de Giro
(NCG) depende, basicamente, da natureza e do nível de atividades dos negócios
da empresa e, portanto, é muito sensível às modificações que ocorrem no
ambiente econômico. A natureza dos negócios da empresa determina seu ciclo
financeiro enquanto o nível de atividade é função das vendas.
Em alguns raros casos, é possível que a NCG seja negativa.
As saídas de caixa, nesses casos, ocorrem depois das entradas de caixa. O
passivo cíclico é maior do que o ativo cíclico, tornando-se uma fonte de fundos
para a empresa. Este, pelo menos, era o caso de muitos supermercados, que
recebiam o valor de suas vendas antes de ter que pagar a seus fornecedores de
mercadorias.
O Saldo de Tesouraria (T) é definido como a diferença entre
o ativo e o passivo erráticos, conforme expressão a seguir: T = ativo errático
– passivo errático.
Se o Capital de Giro for insuficiente para financiar a
Necessidade de Capital de Giro, o Saldo de Tesouraria será negativo, com o
passivo errático maior do que o ativo errático. Essa condição indica que a
empresa está financiando parte de sua Necessidade de Capital de Giro e/ou ativo
permanente com fundos de curto prazo, aumentando, portanto, seu risco de
insolvência. Por outro lado, quando T é positivo, a empresa dispõe de fundos de
curto prazo que poderão ser aplicados em títulos de liquidez imediata. No
entanto um Saldo de Tesouraria positivo em níveis elevados não significa,
necessariamente, uma condição desejável para a empresa. Na verdade, isto pode
significar que seus dirigentes não estão aproveitando as oportunidades de
investimento propiciadas por sua estrutura financeira. Sinal de que a empresa
ainda não tem uma estratégia dinâmica de investimentos.
É de suma importância acompanhar a evolução do Saldo de
Tesouraria, a fim de evitar que permaneça constantemente negativo e crescente.
Caso o autofinanciamento (lucros) de uma empresa não seja suficiente para
financiar o aumento de sua Necessidade de Capital de Giro, seus dirigentes serão
forçados a recorrer a fundos externos, que podem ser empréstimos de curto ou
longo prazos e/ou aumento de capital social em dinheiro. Caso esses fundos não
possam ser obtidos, essa empresa terá sua própria sobrevivência ameaçada.
A Necessidade de Capital de Giro, como já vimos, é função do
nível de atividade de uma empresa. Seu aumento tanto pode ocorrer em períodos
de rápido crescimento como também em períodos de queda nas vendas. O Saldo de
Tesouraria se tornará cada vez mais negativo com o crescimento das vendas, caso
a empresa não consiga que seu autofinanciamento cresça nas mesmas proporções do
seu crescimento da Necessidade de Capital de Giro. Esse crescimento negativo do
Saldo de Tesouraria é que Fleuriet denominou "efeito tesoura".
O "efeito tesoura" ocorre quando a empresa
financia a maior parte da NCG através de créditos de curto prazo. Nesse caso, o
Saldo de Tesouraria (T) se apresenta negativo e crescendo, em valor absoluto,
proporcionalmente mais do que a NCG.
A empresa está se desenvolvendo num "efeito
tesoura" quando este índice se eleva com o passar do tempo. O
acompanhamento cuidadoso do Saldo de Tesouraria, observado sob o prisma do grau
de alavancagem operacional e financeira, dará ao empresário uma medida adequada
de como e quando se endividar. Nem sempre o crescimento das vendas é um
movimento sadio, nem sempre a queda nas vendas é um movimento pernicioso. Tudo
depende da relação entre a variação da NCG sobre as vendas, bem como do
autofinanciamento sobre as vendas.
Fonte: Cola da Web
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