Chefe é uma palavra cada vez menos utilizada nas
organizações. Gestão já começa a não ser tão politicamente correta. Autoridade
começa a ganhar significados mais amplos. Mas, na prática, o que muda?
O mundo tem passado por profundas transformações, que vão
desde o questionamento de estruturas de poder estabelecidas até a forma como
interagimos e conduzimos nossas relações afetivas. Seja no âmbito social ou no
pessoal, paradigmas têm sido quebrados e novos modelos e padrões têm sido
desenhados.
Dentro das organizações, não é diferente. Enquanto parte
desse todo chamado sociedade, o ambiente corporativo não fica imune às
transformações que acontecem no lado de fora de suas paredes. E um dos pontos
nevrálgicos nesse âmbito é justamente o tocante à liderança. Consensualmente
considerada um elemento chave para o bom andamento de qualquer negócio, ela tem
sofrido grandes impactos das mudanças atualmente em curso.
Chefe é uma palavra cada vez menos utilizada nas
organizações. Gestão já começa a não ser tão politicamente correta. Autoridade
começa a ganhar significados mais amplos. Mas, na prática, o que muda?
Em entrevista ao Administradores.com, Antônio Celso Mendes
Webber, autor do recém-lançado livro O líder em xeque, pela editora Bookman,
fala sobre essa reconfiguração da liderança no mundo atual. O estudioso destaca
que quem resistir em conduzir empresas como se fazia há 50 anos, pode acabar
fracassando. Para ele, não há mais lugar para a máxima "manda quem pode,
obedece quem tem juízo", e liderar líderes é mais fácil.
Já no primeiro parágrafo do livro, você diz que a autoridade
é um tipo de poder que depende da legitimidade conferida (ou não) à tentativa
de se exercer uma influência. Com o mundo tendendo cada vez mais ao
colaborativismo, você acha que essa influência monocrática está em declínio?
Enfim, o líder está em xeque?
A ideia de "O líder em xeque" foi originada pela
observação de alguns comportamentos relativamente comuns em empresas que fazem
parte de uma sociedade competitiva e em rápida evolução. Essas mudanças, alavancadas
em profundas transformações no campo do conhecimento técnico, têm feito com que
alguns líderes sintam-se muito ameaçados e fragilizados. O conhecimento, que
tinha antes um ciclo de vida mais longo (cerca de sete anos), tem agora apenas
dois anos, de acordo com uma publicação recente da universidade de Harvard.
Além disso, não podemos esquecer que os aspectos inerentes ao poder formal -
caracterizado pelas estruturas hierárquicas - ainda em uso em muitas
organizações, se contrapõe ao colaborativismo desejado por muitos. Grande parte
dos executivos atuais (pseudolíderes) ainda traz na memória a estrutura
organizacional que vinha sendo utilizada (e ainda é, em muitos casos), baseada
na utilização do poder pela outorga do capital (manda quem pode e obedece quem
tem juízo). Não é fácil abdicar do poder em benefícios de outrem que amanhã
poderá ser o principal concorrente ao seu cargo na empresa. Então, pela
mudança, pelos paradigmas de poder ultrapassados, pela nova sociedade informada
e capacitada, sim, muitas vezes o líder está em xeque. E é exatamente isso que
eu retrato nos 17 casos narrados no livro.
É um tanto quanto consensual entre estudiosos e
profissionais a ideia de que as coisas não funcionam sem líderes. O que você
pensa sobre isso? A autogestão de um determinado grupo é possível?
Só o diabo é mais antigo que a liderança. Mesmo assim,
muitos acreditam que ele foi um anjo caído porque não soube liderar no seu
nível de poder. As coisas também funcionam sem líderes, mas funcionam mal e não
mais têm condições de competir na nova sociedade do conhecimento, no mundo da
tecnologia e da alta competitividade. O líder é fundamental porque as sua
matéria prima é gerar comprometimento. Como o comprometimento só ocorre quando
existe a construção de uma legítima visão compartilhada, onde objetivos comuns
norteiam os comportamentos (tanto dos indivíduos quanto da organização), faço
coro aos que afirmam que os líderes são fundamentais em todos os segmentos da
sociedade e não somente nas empresas. A autogestão é um termo que eu não gosto
muito. Gestão vem de gestor: aquele que parece que nasceu para mandar, que lida
com todos os fatores da produção e assim por diante. Eu gosto mais de grupos
onde existem líderes liderando líderes. Grupos com alta maturidade podem usufruir
desta nova forma de atuação em equipe. É o estado da arte da liderança. É o
comprometimento levado ao seu nível mais elevado. Isso só se obtém com líderes
formadores de novas lideranças.
Na parte do livro em que fala sobre planejamento
estratégico, você diz que a mudança de cultura dentro de uma empresa depende,
entre outras coisas, do comportamento dos líderes e dos liderados. Como um
líder deve se portar diante das mudanças e de que forma a postura dos
colaboradores pode estabilizar ou desestabilizar a liderança?
Líderes e liderados fazem parte sistêmica de um todo maior
que, no caso, é a empresa. Um não sobrevive sem o outro. Aliás, mais importante
do que o próprio líder são os liderados. É deles que emana o poder da
liderança. Como no caso do poder formal, a outorga do poder vem através do
capital. Na liderança, o poder vem dos liderados. Eles têm o poder de escolher
e mudar o seu líder. O líder, para se manter como tal nos processos de mudança,
deve agir com transparência, abertura ao diálogo, poder de convencimento e
argumentação, promovendo a compreensão das razões da mudança e o papel de cada
um no processo. Os liderados podem desestabilizar um processo de mudança e o
líder, através de um comportamento de passividade, pode acabar parando essa mudança.
Isso porque os liderados, quando sem alguém que os conduza, podem acabar
optando por não fazer nada contra a mudança, mas nada a favor, também. Um dos
principais papéis do líder é, então, reduzir essas resistências às mudanças
(que são normais), através de um posicionamento claro e objetivo. Esconder as
informações sobre a mudança irá criar um sentimento de desconfiança mútua e
espaço para que os "fantasmas" do inconsciente atuem sobre o
comportamento dos liderados.
Todo mundo diz que um bom líder precisa saber delegar. Mas,
delegadas as tarefas, ele precisa ser capaz de fazer com que elas sejam
cumpridas. Você concorda? Como isso é possível?
No atual momento de competitividade e múltiplas e complexas
tarefas, o líder tem que delegar para pessoas que tenham a devida maturidade
para levar a cabo a tarefa repassada aos seus colaboradores. A maturidade
compreende alguns fatores sistêmicos importantes: o liderado deve ter
conhecimento técnico daquilo que será delegado; tem que ter capacidade de
relacionamento interpessoal para bem executar o que foi solicitado pelo líder e
o devido comprometimento com os resultados esperados. Se os liderados não
possuírem esses requisitos fundamentais, o líder não deverá delegar. Para que
sejam obtidos bons resultados com a delegação é necessário:
- Preparar os liderados
- Controlar e acompanhar os mesmos de acordo com as suas
maturidades (quanto mais alta a maturidade, menor a necessidade de controle;
quando menor for a mesma, mais intenso deverá ser o controle sobre os colaboradores
que receberam a delegação).
Vale lembrar ainda que o líder delega poder e jamais a
responsabilidade perante a empresa. Essa responsabilidade perante a empresa
sempre será do líder. Por isso, a maior importância do líder é a de delegar
bem.
Qual a importância e o limite da afetividade na relação
entre líderes e liderados?
A afetividade faz parte da vida humana. Mais uma vez, a
diferença será o nível de maturidade entre líderes e liderados. O grande risco
de o líder desenvolver relações afetivas no trabalho com pessoas de maturidade
baixa é transformar essa relação em uma relação paternalista (como se fosse uma
relação entre pai e filhos). As pessoas de maturidade baixa irão gostar dessa
relação e irão se comportar como filhos e dependentes do pai, decorrendo desta
relação uma postura profissional muito deficiente. O que sempre sugerimos é um
equilíbrio entre os comportamentos afetivos e os racionais. Alguém que
compreenda o ser humano na sua integralidade, mas que saiba cobrar metas;
alguém que dê um feedback positivo, mas que, no momento do erro, saiba promover
o feedback crítico e assim por diante. A melhor forma de o líder ser afetivo
com os seus liderados é proporcionando condições de desenvolvimento
profissional, como coaching e feedbacks. Neste caso, ambas as partes saberão os
limites do afetivo e do racional.
Fonte: Administradores
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