Você já deve ter escutado que elas têm o objetivo de
influenciar o processo de decisão nas compras e até o nosso comportamento. Mas
será que o direito de escolha pode ser realmente afetado? Você está bem
confortável na poltrona do cinema e, de repente, vem uma forte vontade de beber
um determinado refrigerante. Posteriormente, tem conhecimento de que, ao longo
do filme, foram exibidas imagens incentivando o consumo da bebida sem que você
percebesse.
Outro dia, decide visitar algumas lojas para comparar
preços. Mas, inesperadamente, a sua compulsão de compra aumenta na primeira
loja visitada. O artifício desta súbita vontade está na música ambiente, que
sussurra frases inaudíveis do tipo "Compre o que gostou".
Parece até filme de ficção científica, mas há quem acredite
na força das mensagens abaixo do limiar da percepção, as chamadas mensagens
subliminares. Dizem que elas têm o poder de ditar comportamentos, aumentar o
consumo de determinados produtos ou, em resumo, manipular mentes. Este é um tema, sem dúvida, controvertido e
polêmico, que não consegue ser descartado cientificamente e que, volta e meia,
vem à tona apresentando experiências de cair o queixo.
Contextualizando
A utilização desse tipo de mensagem é muito mais antiga do
que podemos imaginar. “O conceito existe
desde os gregos, citado por Demócrito (400 a.C.), Epicuro e outros filósofos.
As pesquisas iniciaram-se na área da Medicina, em Psiquiatria, na qual
experimentos eram conduzidos em laboratório com grupos de controle em
universidades da Europa. Mas, somente com o caso Vicary, no século 20, o
conceito foi incorporado ao vocabulário da mídia e popularizado até a
banalização”, explica o professor da UNESP Flávio Calazans, doutor pela USP e a
maior autoridade brasileira sobre o tema.
O professor se refere a um dos mais conhecidos eventos
relacionados ao assunto. Nele, o gerente de Marketing e publicitário Jim Vicary
influenciou o comportamento de uma plateia de cinema durante a projeção do
filme “Picnic”, em 1956. Com um taquicoscópio (espécie de projetor de slides),
ele veiculou mensagens com as frases “Drink Coke” e “Eat Pop Corn”, de forma
rápida demais para ser percebida conscientemente. A projeção do slide na
velocidade de 1/3.000 de segundo, sobreposto ao filme, fez com que a repetição
do sinal subliminar causasse efeitos no subconsciente do público. Apesar de a
experiência não ter dados exatos ou rigor científico, observou-se um aumento de
57,7% nas vendas do refrigerante e de 18,10 % da pipoca.
Efeitos e defeitos
Para o professor Calazans – que estuda há 20 anos a
propaganda subliminar multimídia – é possível encontrar esse tipo de mensagem
em diferentes formas de comunicação. Existem provas de que ela funciona como,
por exemplo, os efeitos bioquímicos da exposição a cenas com violência,
apoiadas pelas teses de Kenji Toma. Nele, “há relação entre o hormônio
testosterona e os impulsos psicológicos agressivos como resultante da exposição
a filmes cinematográficos violentos”, explica o professor, que chama o processo
de Biomidiologia.
Em contraposição, de acordo com a psicóloga e publicitária
Thays Babo, não há muitos estudos publicados que comprovem a ligação entre
percepção subliminar e persuasão. “Não sei se é de interesse que isso seja
comprovado publicamente, já que é um recurso poderoso para as propagandas.
Seria preciso impedir que houvesse esse tipo de mensagem veiculada”, comenta a
psicóloga.
De acordo com ela, nem tudo o que queremos está consciente
para nós. “Acredito que seja possível induzir ao consumo de algo que não se
desejava inicialmente, ou não com muita intensidade. Mas, não necessariamente,
a algo repulsivo. Contudo, se a consciência estiver alterada, é muito mais
fácil induzir um comportamento, dependendo da situação – por exemplo, em grupo,
em momentos de extrema tensão etc.”, explica Thays.
A opinião também é compartilhada pelo psicoterapeuta
Alessandro Vianna. “Se as censuras e limites não forem bem claros na formação
da personalidade, a pessoa pode ter algumas atitudes estimuladas por essas
mensagens”, alerta. De acordo com Alessandro, essas mensagens estão em toda
parte. “Para se ter uma ideia, nossos olhos captam cerca de um milhão de
informações visuais diariamente. É praticamente impossível uma pessoa ‘normal’
digerir todo esse bombardeio de imagens vindas da sociedade, da natureza, da
família, sem ser influenciado diretamente por mensagens subliminares”, adverte
o psicoterapeuta.
Você está escutando isso?
Efeitos subliminares relacionados ao som também são
amplamente debatidos e sua real funcionalidade é constantemente colocada à
prova. Algumas correntes indicam que é possível encontrar mensagens demoníacas
e de apelo sexual em músicas tocadas ao contrário, técnica conhecida como
backward masking. Porém, não há nada que comprove cientificamente que o ser
humano seja capaz de captar esse tipo de mensagem às avessas.
Recentes estudos realizados pela Northwestern University
apontam, no entanto, que, ao colocarmos sons enquanto dormimos, estes podem
ajudar no processo de consolidação das nossas memórias, inclusive das
lembranças do que aprendemos. Nessa pesquisa, voluntários observaram 50
imagens, com respectivos sons, mostradas em sequência numa tela. Ao dormirem, metade dos voluntários foi
exposta aos mesmos sons quando entraram na fase de ondas cerebrais lentas, em
que o sono é mais profundo.
A percepção da memória mostrou-se surpreendente.
"Nossos resultados indicaram que informações recebidas durante o sono
podem influenciar a memorização. Isso não significa que seja possível aprender
qualquer coisa dormindo. Além disso, o aprendizado noturno exige que a pessoa
tenha contato prévio, acordada, com o que deseja aprender”, conclui o estudo,
que confirmou uma descoberta similar feita por neurologistas alemães.
Merchandising editorial
Com a crescente evolução do tema e suas possibilidades
positivas e negativas, algumas correntes começaram a questionar tipos de
publicidade que, apesar de vistos como lícitos e comumente praticados, podiam
estar usando os artifícios subliminares – entre eles, o próprio merchandising
editorial. “Ocorre que nem sempre o consumidor está disposto a atribuir
credibilidade aos anúncios ostensivos, declaradamente comerciais. Isso porque
ele raciona e ativa mecanismos psíquicos de autodefesa em face da mensagem persuasiva
publicitária”, explica Calazans.
Com isso, passou-se a buscar a utilização de publicidade
dentro de novelas e filmes, num clima de neutralidade e dissimulação, onde é
mais fácil a penetração de um produto a ser consumido. Nesse caso, o
merchandisingeditorial geralmente não dura mais de três segundos, a fim de não
virar propaganda explícita.
De acordo com o publicitário Gustavo Bastos, da agência
11:21, que atua na produção de anúncios em diversas mídias, “o que pode ser
considerado como mensagem subliminar hoje é a presença de uma marca ligada a um
personagem de um filme de maneira tão natural que o consumidor é influenciado
sem perceber. Dois exemplos claros disso são a propaganda de cigarros nos
filmes americanos da década de 1940 até 1970, e o carro do 007”. Para Gustavo,
“esse tipo de mensagem pode influenciar o comportamento apenas se o produto
combinar com o personagem”. Inclusive, ele conta que já fez um comercial de TV
que brinca com o tema (veja abaixo).
Polêmicas à parte, há quem acredite no poder educativo do
merchandising. Os Correios conseguiram registrar uma diminuição de 30% no envio
de cartas mal endereçadas no país a partir da abordagem do assunto numa novela
da rede Globo, na qual uma carta importante não conseguia chegar ao seu destinatário,
alterando o desfecho da história.
Entretanto, esse tipo de publicidade encoberta, para uma
corrente científica, não é subliminar, pois os sons e imagens são percebidos de
forma consciente pela audiência. Inclusive, é possível até a rescisão do contrato
entre empresa e veículo de comunicação, caso o produto não apareça por tempo
suficiente para ser identificado.
Flavio Porto, publicitário e um dos sócios da agência
Kindle, especializada em comunicação digital, defende essa tese e acredita que
nem tudo pode ser considerado subliminar. “Tudo depende da forma como é
inserido. O tosco e muito direto jamais será subliminar, como vemos em algumas
novelas e reality shows. O subliminar é percebido como sofisticado e mexe com
sentidos e percepções”, afirma.
O tema que, para muitos, é uma lenda urbana e, para outros,
uma realidade inquestionável, deve estar sendo constantemente lembrado para que
o direito de escolha do consumidor não seja afetado. Acreditando ou não em seus
efeitos, é bom, pelo menos, ficar mais atento nos próximos anúncios da TV. Que
tal, então, beber um refrigerante agora?
Legislação
No Brasil, não existe nenhuma lei que proíba expressamente
qualquer modalidade de propaganda subliminar. Em casos assim, é proposto que se
aplique o artigo 20 do Código de Ética dos Publicitários, que declara que as
mensagens devem ser ostensivas e assumidas, assim como também o artigo 36 do
Código de Defesa do Consumidor, que proíbe anúncios disfarçados. Já na União Europeia
e nos Estados Unidos, há legislação proibindo alguns gêneros de subliminares.
EXEMPLOS PRÁTICOS DE SUBLIMINARES
Disney
No desenho “Bernardo e Bianca”, de 1977, há inserção de dois
fotogramas de uma mulher com os seios à mostra. A cena acontece aos 28 minutos
do filme e é visível apenas quadro a quadro. A Disney admitiu publicamente ter
encontrado imagens abaixo do limiar de percepção e foi obrigada a recolher 3,4
milhões de fitas em locadoras de vídeo nos Estados Unidos.
Cartaz do filme “O Silêncio dos Inocentes”
No cartaz de “O Silêncio dos Inocentes”, vencedor de cinco
Oscars de 1992, também é possível encontrar esse tipo de mensagem. As imagens
apresentadas na capa do filme possuem diferentes graus de subliminariedade. O
1º grau: a caveira branca dentro da mariposa; de 2º grau: as três mulheres
brancas nuas; e de 3º grau: as outras quatro mulheres nuas, cor de laranja.
Bush e as eleições
Em setembro de 2000, no decorrer da campanha presidencial
norte-americana, um vídeo de televisão do candidato George Bush ganhou
repercussão polêmica na mídia internacional. Ao veicular críticas ao programa
do candidato democrata Al Gore, é possível encontrar, através de um frame, a
palavra “rats” (ratos) sobreposta à frase “bureaucrats decide”. Alex
Castellano, responsável pela campanha de Marketing de Bush, declarou que a
inserção foi acidental. O filme foi veiculado 4.400 vezes em cobertura nacional
antes de ser denunciado e cancelado.
Free e Close-Up
Treze dias antes da publicidade de cigarro ser banida das
TVs no Brasil, em 2001, a campanha do cigarro Free saiu do ar. O Ministério
Público de Brasília concluiu que as frases ditas pelo personagem central
estimulavam o comportamento rebelde por parte do adolescente, além de conteúdo
subliminar com pessoas fumando em frames de 3/10 de segundo. Já o creme dental
Close-Up teve que alterar uma de suas propagandas, em 2003, após o Conselho de
Ética do Conar verificar o uso de palavras de baixo calão escritas em alguns
quadros do anúncio.
Caso da MTV
Em novembro de 2002, a MTV Brasil foi processada por
transmitir mensagem subliminar em suas propagandas, sendo até condenada após a
veiculação de uma vinheta que mostrava flashes de imagens pornográficas e
sadomasoquistas. De acordo com o Ministério Público, responsável pela ação
civil pública, a vinheta, quando submetida à velocidade mais lenta, mostra
cenas explícitas de sadomasoquismo. Veja
o vídeo abaixo:
Pokémon
Em 1997, 728 crianças no Japão sofreram ataques epilépticos
após assistirem a cenas do desenho que exibiam efeitos com cores. A animação
piscou, durante cinco segundos, 54 luzes intensas das cores (vermelha, branca e
azul) intermitentemente, em looping, forçando o nervo óptico e o cérebro com
mais intensidade. O objetivo inicial dos desenhistas japoneses era a inserção
de um forte estímulo visual para criar tensão emocional extrema.
Testando seu limiar de percepção
Qual elemento diferente você nota no quadro “Os
Embaixadores” (1533), de Hans Holbein?
O que existe nessa imagem, além do grão de café?
Nem tudo é apenas o que parece. Isso fica mais claro em
algumas obras de Salvador Dalí com a utilização da ilusão de ótica.
Fonte: Administradores.com.br
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