A cultura de “apagar incêndios” ou “correr atrás do
prejuízo” cria indisciplina administrativa e despadronização dos processos,
gerando, por sua vez, mais defeitos e mais retrabalhos, sempre com mais
urgência e menos planejamento
Boa parte dos nossos líderes empresários e gestores insistem
em administrar os negócios como arte e não como ciência. Enxergam os resultados
dos processos industriais ou dos serviços como únicos, a partir de uma
percepção muito pessoal e cheia de emoção. A definição de ciência, num sentido
mais amplo, refere-se ao conhecimento ou prática sistemática adquirida através
de métodos científicos, princípios ou leis. A cultura de “apagar incêndios” ou
“correr atrás do prejuízo” cria indisciplina administrativa e despadronização
dos processos, gerando, por sua vez, mais defeitos e mais retrabalhos, sempre
com mais urgência e menos planejamento. É assim que se cria um círculo vicioso.
Nesse tipo de ambiente não há espaço para métodos científicos e aquisição de
conhecimento.
Existem técnicas e ferramentas para melhoria dos processos
e, consequentemente, de competitividade que foram exaustivamente testadas e
aprovadas nos últimos 30 ou 40 anos. São recursos que impuseram um novo nível
de qualidade a produtos e serviços no mercado internacional. Muitos devem se
lembrar da investida que a indústria automotiva japonesa fez no maior e mais
competitivo mercado do planeta, com produtos de alta qualidade e baixo preço.
Não foi à custa de percepção e emoção. Obviamente, houve um esforço coordenado
de reconstrução da indústria por parte de órgãos oficiais. Mas, também, foi à
custa de muito planejamento, método e capacitação dos colaboradores em
ferramentas da qualidade simples e efetivas que as empresas japonesas
conseguiram se impor. Com uma força de trabalho capacitada em métodos e
técnicas de trabalho, e acreditando nos colaboradores, fica mais fácil melhorar
todos os processos produtivos simultaneamente e melhorar a qualidade dos
produtos e serviços. Ou seja, todo o negócio ganha um upgrade.
O conjunto de métodos e ferramentas que conseguiu erguer a
indústria japonesa no pós-guerra recebeu o nome de Lean Manufacturing (produção
enxuta) ou Lean Thinking (pensamento enxuto). Era quase uma filosofia de
trabalho, que foi sendo adotada por grandes empresas no mundo todo, com bons
resultados. Posteriormente, o mundo industrial e de negócios ganhou outra
ferramenta de melhoria de processos: oSix Sigma. Tirando proveito de conceitos
de controle estatístico dos processos criados nos anos 30, só que com outra
roupagem, essa ferramenta ataca a variabilidade dos processos de forma
estatística. Além disso, utiliza de forma bastante intensa a “voz do cliente”
como base para medir a eficiência dos processos industriais e de serviços. Mais
uma vez, empresas do mundo todo passaram a aplicar essa ferramenta
corporativamente, com bom retorno. Com a disseminação dessas ferramentas em
grandes empresas, seus fornecedores foram igualmente convencidos a adotá-las
para entregar produtos de melhor qualidade, com menor variabilidade e menor
custo.
Diante desse quadro, uma dúvida: por que ainda existem
empresas que relutam em adotar técnicas e ferramentas científicas? É correta a
justificativa de que o ambiente de negócios no Brasil é singular e dificulta a
administração científica. Igualmente é correto alegar que as pequenas empresas
sofrem com excesso de impostos e falta de recursos financeiros. Ainda assim, é
possível aplicar algumas ferramentas e métodos científicos com a finalidade de
melhorar a produtividade, reduzir a ocorrência de erros e defeitos, aumentando,
consequentemente, a satisfação dos clientes.
Muitas empresas podem ter falhado na implementação das
ferramentas por acharem que deveriam implantar todas ao mesmo tempo, nos moldes
de programas de qualidade e produtividade das grandes organizações. Também pode
ter havido falta de acompanhamento e cobrança por parte dos líderes na sua
utilização. Mas é fato que as ferramentas de qualidade e produtividade podem
sim ser implantadas individualmente – de preferência, começando pelas mais
simples e mais efetivas na organização dos postos de trabalho, ou por aquelas
que trarão disciplina na análise de problemas de uma maneira geral.
Uma dessas ferramentas de análise é tão simples como
perguntar varias vezes “por que” um evento ocorreu, imitando a incansável
curiosidade infantil, em busca de porquês que nem sempre os pais têm como
justificar. Trata-se dos “5W”, ou “5 Whys”. Além de ajudar na identificação de
causas raiz dos problemas industriais ou de serviços, essa ferramenta cria uma
disciplina mental, ajudando no processo analítico e na tomada de decisão em
qualquer área ou processo da empresa. A falta de método na resolução de problemas
leva a ações incorretas que muitas vezes atacam o efeito e não a causa, fazendo
com que o problema não seja resolvido. Daí a importância de se esgotar todos os
porquês antes de tomar medidas corretivas. Vale lembrar que esse método não
busca culpar pessoas, mas encontrar falhas no processo.
Outra ferramenta é tão simples como fazer uma boa limpeza e
arrumação em nossos armários, jogando fora tudo o que não se usa e deixando à
mostra as coisas que precisamos no dia a dia. Neste caso, falamos do “5S”, que
representa cinco palavras no idioma japonês: Seiri (Utilização); Seiton
(Organização); Seiso (Limpeza); Seiketsu (Padronização); Shitsuke
(Autodisciplina). De novo, é uma ferramenta aplicada por uma equipe na
sequência indicada. Por exemplo, não se passa para a fase de limpeza antes de
deixar tudo organizado, bem como não se organiza antes de fazer a seleção do
que presta e do que não presta – o que acaba criando na equipe o senso de
disciplina, além de melhorar as condições de trabalho. Com o ambiente limpo e
organizado, fica mais fácil identificar falhas, vazamentos ou matérias primas
erradas. Além disso, outros ganhos englobam redução de perda de tempo, redução
de despesas, melhor aproveitamento de espaços e redução de acidentes de
trabalho.
Já que não conseguimos conhecer bem algo que não podemos
medir ou expressar em números, lançamos mão de outro conceito. Afinal, como
saber se os nossos investimentos estão sendo valorizados? Só através de números
– dos índices da bolsa de valores ou dos fundos de investimento. Mais um
exemplo: como os médicos podem dizer se estamos bem de saúde? Só através de
medidas da pressão arterial, dos batimentos cardíacos e exames clínicos, entre
outros. São números que, quando comparados a medidas-padrão, indicam boa saúde
(benchmark). Na produção ou prestação de serviços ocorre o mesmo. A coleta de
dados sobre o processo – e plotagem num gráfico ao longo do tempo – mostra como
ele está em relação aos limites preestabelecidos. Com isso, o operador terá
completa consciência do rendimento do processo, podendo alertar para variações
especiais. Essa ferramenta tem o nome de CEP (Controle Estatístico do Processo)
– e nos ajuda fazer o monitoramento sem produzir erros ou defeitos. Dependendo
da sua aplicação, será uma ferramenta simples ou complexa.
Independentemente do tamanho ou da natureza dos problemas de
uma empresa, todas as ferramentas citadas acima e muitas outras estão
disponíveis – aguardando apenas que um gestor mais determinado se disponha a
conhecer o que elas podem fazer para que ele nunca mais se encontre “correndo
atrás do prejuízo” e muito menos “apagando incêndios”.
Fonte: Administradores
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