domingo, 4 de maio de 2014

Espaço do Administrador - Efeito Tesoura - Alavancagem Financeira de uma Empresa




O empresário, em geral, é bastante intuitivo com relação aos riscos envolvendo seu negócio. Em todas as suas decisões há sempre, em algum grau, considerações sobre as probabilidades de acerto ou de erro de seus resultados. Logicamente, os resultados esperados são traduzidos pelo lucro das operações em cada período medido, que, em última análise, representa o autofinanciamento da sobrevivência de sua empresa.

A relação do lucro com os investimentos realizados dá a medida do retorno pelo qual o empresário assumiu tantos riscos. Tanto em termos absolutos quanto relativos, o retorno guarda relação direta com os riscos assumidos. No sentido mais amplo, risco pode ser definido como a possibilidade de perda financeira. Toda decisão, portanto, exige do empresário considerações sobre o risco esperado para um retorno esperado. O risco do negócio pode ser definido como a incapacidade para cobrir os custos operacionais. Corre-se o risco financeiro quando o lucro não é suficiente para cobrir os custos financeiros. A alavancagem combinada pode ser considerada como o impacto total dos custos fixos na estrutura operacional e financeira da empresa. Nesse sentido, toda a empresa é alavancada em algum grau e disso dependem os níveis de risco e retorno para seus proprietários.

É interessante notar que muitos empresários que se declaram aversos ao risco e que são caracteristicamente conservadores e defensivos em suas decisões conduzem os seus negócios através da constituição e manutenção de pesadas estruturas organizacionais, com elevada incidência de custos fixos. Sua aversão é, na verdade, apenas ao risco financeiro. Isso é explicado porque esses mesmos empresários costumam compensar quedas de vendas com uma substancial redução de custos fixos, principalmente com expressivos cortes de pessoal. E muitas vezes chamam isso de downsizing.

Estamos particularmente interessados no grau de aversão ao risco financeiro, isto é, no grau de alavancagem que o empresário está disposto e preparado para imprimir ao seu negócio pela obtenção de fontes de financiamento de curto e longo prazos a terceiros. Não há dúvida de que o risco financeiro é o mais temido, sob várias alegações: altos juros nominais, distorções do sistema financeiro, exploração dos bancos, entre outros.

Uma das armadilhas mais intrigantes atende pelo nome de "efeito tesoura" e teve seu conceito desenvolvido por Michel Fleuriet e equipe, publicado no livro A Dinâmica Financeira das Empresas Brasileiras, em co-edição da Consultoria Editorial Ltda. e da Fundação Dom Cabral, Belo Horizonte, 1980. O conceito de "efeito tesoura" traz em seu bojo outros conceitos revolucionários para uma adequada sistematização da alavancagem financeira de uma empresa, principalmente levando-se em conta os empréstimos de curto prazo.

Fleuriet acrescentou ao clássico conceito de Capital de Giro Líquido (CGL) os conceitos de Necessidade de Capital de Giro (NCG) e Saldo de Tesouraria (T). Para tanto reclassificou os grupos de contas do passivo (fontes) e do ativo (aplicações) conforme a realidade dinâmica das empresas, em que as contas relacionam-se ao mesmo tempo, o que lhes confere estado de permanente movimentação.

Algumas contas, quando analisadas isoladamente ou em relação ao conjunto de outras contas, apresentam movimentação tão lenta que podem ser consideradas como "permanentes ou não-cíclicas". Outras, em contrapartida, apresentam movimento "contínuo e cíclico", bem de acordo com o ciclo operacional da empresa. Existem outras, finalmente, que apresentam movimento "descontínuo ou errático", em nada ou quase nada se relacionando com o ciclo operacional.

No sentido financeiro clássico, o Capital de Giro Líquido (CGL) define-se como: CGL = ativo circulante – passivo circulante. Já a Necessidade de Capital de Giro (NCG) é definida pela expressão: NCG = ativo cíclico – passivo cíclico.

Na maioria das empresas, as saídas de caixa ocorrem antes das entradas de caixa. Essa situação cria uma necessidade de aplicação permanente de fundos, que se evidencia no balanço por uma diferença positiva entre o valor das contas cíclicas do ativo e das contas do passivo. Essa diferença entre as contas cíclicas é que se denomina NCG.

Importante ressaltar que a Necessidade de Capital de Giro (NCG) depende, basicamente, da natureza e do nível de atividades dos negócios da empresa e, portanto, é muito sensível às modificações que ocorrem no ambiente econômico. A natureza dos negócios da empresa determina seu ciclo financeiro enquanto o nível de atividade é função das vendas.

Em alguns raros casos, é possível que a NCG seja negativa. As saídas de caixa, nesses casos, ocorrem depois das entradas de caixa. O passivo cíclico é maior do que o ativo cíclico, tornando-se uma fonte de fundos para a empresa. Este, pelo menos, era o caso de muitos supermercados, que recebiam o valor de suas vendas antes de ter que pagar a seus fornecedores de mercadorias.

O Saldo de Tesouraria (T) é definido como a diferença entre o ativo e o passivo erráticos, conforme expressão a seguir: T = ativo errático – passivo errático.

Se o Capital de Giro for insuficiente para financiar a Necessidade de Capital de Giro, o Saldo de Tesouraria será negativo, com o passivo errático maior do que o ativo errático. Essa condição indica que a empresa está financiando parte de sua Necessidade de Capital de Giro e/ou ativo permanente com fundos de curto prazo, aumentando, portanto, seu risco de insolvência. Por outro lado, quando T é positivo, a empresa dispõe de fundos de curto prazo que poderão ser aplicados em títulos de liquidez imediata. No entanto um Saldo de Tesouraria positivo em níveis elevados não significa, necessariamente, uma condição desejável para a empresa. Na verdade, isto pode significar que seus dirigentes não estão aproveitando as oportunidades de investimento propiciadas por sua estrutura financeira. Sinal de que a empresa ainda não tem uma estratégia dinâmica de investimentos.

É de suma importância acompanhar a evolução do Saldo de Tesouraria, a fim de evitar que permaneça constantemente negativo e crescente. Caso o autofinanciamento (lucros) de uma empresa não seja suficiente para financiar o aumento de sua Necessidade de Capital de Giro, seus dirigentes serão forçados a recorrer a fundos externos, que podem ser empréstimos de curto ou longo prazos e/ou aumento de capital social em dinheiro. Caso esses fundos não possam ser obtidos, essa empresa terá sua própria sobrevivência ameaçada.

A Necessidade de Capital de Giro, como já vimos, é função do nível de atividade de uma empresa. Seu aumento tanto pode ocorrer em períodos de rápido crescimento como também em períodos de queda nas vendas. O Saldo de Tesouraria se tornará cada vez mais negativo com o crescimento das vendas, caso a empresa não consiga que seu autofinanciamento cresça nas mesmas proporções do seu crescimento da Necessidade de Capital de Giro. Esse crescimento negativo do Saldo de Tesouraria é que Fleuriet denominou "efeito tesoura".

O "efeito tesoura" ocorre quando a empresa financia a maior parte da NCG através de créditos de curto prazo. Nesse caso, o Saldo de Tesouraria (T) se apresenta negativo e crescendo, em valor absoluto, proporcionalmente mais do que a NCG.

A empresa está se desenvolvendo num "efeito tesoura" quando este índice se eleva com o passar do tempo. O acompanhamento cuidadoso do Saldo de Tesouraria, observado sob o prisma do grau de alavancagem operacional e financeira, dará ao empresário uma medida adequada de como e quando se endividar. Nem sempre o crescimento das vendas é um movimento sadio, nem sempre a queda nas vendas é um movimento pernicioso. Tudo depende da relação entre a variação da NCG sobre as vendas, bem como do autofinanciamento sobre as vendas.

Fonte: Cola da Web


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