Você provavelmente nunca ouviu falar de Luis Von Ahn, mas
com certeza está familiarizado com seu trabalho. Da busca de imagens do Google
àquelas letrinhas que você tem que digitar como confirmação em formulários,
muita coisa tem a mão dele
Professor de Ciências da Computação na Universidade de
Carnegie Mellon, Luis Von Ahn ainda é o responsável por melhorar o sistema de
busca de imagens do Google e ajudar a digitalização de livros por meio do
Captcha. Sempre buscando soluções a partir do crowdsourcing, o novo desafio de
Ahn é traduzir toda a internet, ao mesmo tempo em que ensina às pessoas, de
graça, um novo idioma.
Por que você decidiu traduzir a internet e como o Duolingo
está ajudando nessa empreitada?
Existem aproximadamente 1,2 bilhões de pessoas no mundo
aprendendo uma língua hoje. A maioria dessas pessoas, cerca de 800 milhões,
está aprendendo inglês e pertence a uma classe social mais baixa. Entretanto,
aprender outro idioma exige bastante dinheiro, pois são cursos caros. Eu quis
inventar uma forma de ensinar outras línguas às pessoas, de graça. E pensei:
deve existir uma maneira de financiar isto.
Mas se não vamos cobrar dos usuários, como vamos fazer? Foi
quando nós percebemos que poderíamos traduzir a internet ao mesmo tempo em que
ensinamos um novo idioma. A ideia do Duolingo é que, em vez de cobrar dos
alunos com dinheiro, o que fazemos é inserir exercícios de tradução, que são
páginas da internet. É um método bom para todos! O aluno exercita o que aprende
e nós conseguimos lucrar a partir da venda dessas traduções.
Então, se alguém, por exemplo, um jornal ou portal de
notícias, deseja traduzir seu conteúdo do inglês para o português, nós podemos
fazer o serviço para eles e cobramos por isso. Mas seriam os estudantes
traduzindo, ao mesmo tempo em que aprendem. Então essa era a ideia inicial e o
objetivo do Duolingo.
A plataforma é capaz de substituir o ensino tradicional? O
estudante aprende a escrever, a ler e a falar com fluência no Duolingo?
Nem tudo o que as pessoas fazem no Duolingo é tradução,
apenas alguns exercícios são. A plataforma é completa e pode ensinar tudo. O
sistema conversa com o aluno e consegue avaliar se o que ele diz está correto,
assim como o estudante precisa entender o que ele diz. O método é semelhante ao
de um jogo.
Existe um plano de expansão do Duolingo?
Sim, nós estamos focando bastante na América Latina,
especialmente, porque eu nasci na Guatemala. Outro projeto para os próximos
dois meses é implementar provas e certificados de proficiência. Veja, exames
como o TOEFL são extremamente caros e não existe motivo para isso, além do fato
das empresas quererem lucrar. O custo de uma prova como essa é de cinco dólares
por candidato e eles cobram 200 dólares, isso não é bom. Nós queremos fazer uma
versão mais barata desses testes e aumentar o acesso das pessoas a provas como
essas.
Você pode nos contar um pouco sobre o seu projeto chamado
“Games with a purpose”?
Sim, esse foi um projeto desenvolvido há alguns anos, que
foi vendido ao Google. Era um jogo chamado ESP Game, que posteriormente se
transformou no Google Image Labeler. A ideia era que, enquanto as pessoas
jogavam, elas também estavam ajudando a melhorar o sistema de busca por
imagens. Ao mesmo tempo em que se divertiam, elas diziam ao Google quais eram
os melhores resultados na busca de imagens e quais eram ruins.
Um dos seus projetos mais conhecidos é o Captcha. Você
poderia nos contar como ele se tornou o ReCaptcha?
O Captcha original, que ajudei a inventar, em 2000, era
apenas um mecanismo de segurança para a internet. O sistema funciona porque as
pessoas são capazes de ler esses caracteres, que computadores não conseguem.
Então, por exemplo, no caso do Facebook, a razão pela qual você precisa digitar
um Captcha quando cria uma conta é para garantir que uma pessoa esteja fazendo
isto e não um programa de computador criado para obter dados de milhares de
outras contas.
Esse é o Captcha original. Em um dado momento, percebi que
200 milhões de Captchas eram digitados todos os dias por pessoas ao redor do
mundo. No princípio, fiquei muito orgulhoso do impacto que a minha pesquisa
teve, porém me senti mal pelo desperdício de tempo que é. Cada pessoa leva 10
segundos para digitar um Captcha, se multiplicarmos por 200 milhões, chegamos a
um desperdício de tempo de aproximadamente 500 mil horas por dia.
Então, comecei a pensar em maneiras de reutilizar esse
esforço. Seria possível fazer outro trabalho durante esses 10 segundos? E a
resposta é sim. Com o ReCaptcha, quando você digita as palavras, você não está
apenas provando que é uma pessoa, mas também está nos ajudando a digitalizar
livros.
E como o ReCaptcha funciona?
Bem, a ideia é transformar obras físicas em digitais, para
disponibilizá-las na internet. Durante o processo, o livro é scaneado, página
por página. Isto nos dá imagens de todas as palavras, que são encaminhadas para
um leitor óptico (OCR) que deve decifrar o que está escrito ali. O problema é
que quando o livro é um pouco antigo e a tinta está apagada, o computador não
consegue entender algumas letras. Então, o que nós fazemos é pegar todas as
palavras que o computador não consegue ler e as colocamos em Captchas, para que
as pessoas resolvam. Então, os Captchas que você digita hoje são aqueles que o
computador não conseguiu reconhecer e que vão ajudar a digitalizar um livro.
Você acredita que o crowdsourcing promoverá um impacto no
modelo tradicional de negócios?
Eu acredito que existem algumas formas de impacto. Nós
estamos vendo diversos negócios sendo executados de maneira semelhante ao
crowdsourcing. Por exemplo, existe o website 99designs.
Se antes você precisava contratar um designer em algum
lugar, hoje você só precisa escrever o que precisa e várias pessoas farão esse
trabalho, para que você escolha o melhor. Existem milhares de exemplos de
serviços como esse, onde o crowdsourcing está substituindo o processo natural
dos negócios, o modelo tradicional. Não funciona para tudo, mas ajuda em
algumas coisas.
Eu usaria como exemplo a Wikipedia, que é simplesmente
melhor que todas as enciclopédias, não existe mais competição. Eu acredito que
a Britannica saiu do mundo dos negócios por causa da Wikipedia, que é
alimentada por crowdsourcing.
Você tem vendido suas ideias para grandes empresas desde
cedo e consegue atrair diversos investidores. Como você convence as pessoas a
acreditarem no seu negócio?
Eu acredito que o mais importante foi sempre ter um produto
que funciona. Antes de tentar convencer qualquer pessoa, eu trabalhei no
produto. Quando os outros viam meu trabalho, podiam atestar que realmente
estava pronto e funcionava. Demonstrar é muito mais fácil do que falar. É o
mesmo com o Duolingo, uma plataforma que é eficiente. Existe hoje sete milhões
de usuários, então seu sucesso é inquestionável. A chave é fazer primeiro.
Fonte: Administradores
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