domingo, 1 de fevereiro de 2015

Eventos no Facebook podem gerar processos, diz especialista




Os eventos falsos se espalharam pelo Facebook nos últimos meses.

Apesar de muitos deles terem teor humorístico, esse tipo de conteúdo, se ofensivo, pode gerar processos e indenizações por danos morais.

Segundo Gisele Arantes, advogada especialista em direito digital e sócia do escritório Assis e Mendes, informa que, com bom senso, é possível se manifestar nas redes sociais ou mesmo fazer brincadeiras.

Por que os eventos no Facebook podem gerar processos?

Gisele Arantes - Muitos eventos nas redes sociais são criados para manifestar ou criticar algum fato. Muitas pessoas compartilham aquilo e formam uma comunidade.

Até que ponto isso pode ou não? A Constituição Federal garante, protege a liberdade de expressão e a manifestação do pensamento.

Com isso, criar um evento nas redes sociais para expor opinião ou para fazer uma critica de forma “educada”, não constitui crime nem é passível de indenização.

Um exemplo que temos atualmente é a comunidade do “banho coletivo na casa do Alckmin”.

A princípio, imagina-se que as pessoas estão ofendendo dizendo barbaridades, mas não. O que acontece lá é que a página ganhou teor humorístico e até tornou-se um lugar em que as pessoas conversam sobre o assunto.

Percebe-se que elas não estão ali para ofender, mas para manifestar sua indignação por um determinado fato, a falta d'água, bem como o longo tempo que o governador levou para declarar o racionamento.

As pessoas cometem um crime ou passam a ser puníveis perante a lei quando elas excedem o direito de liberdade de expressão e manifestação do pensamento.

Ou seja, quando elas ofendem uma terceira pessoa. Apesar dos direitos garantidos de expressão, há um limite, porque se você atingir o direito de outra pessoa, você passará a ser punível por isso.

Isso pode acontecer tanto na esfera cível, por danos morais, ou até criminal, caso você pratique crimes de ofensa contra a honra (calúnia, injúria ou difamação).

Utilizar as redes sociais, ou a internet como um todo, para se manifestar com bom senso, pode.

O que você tem que tomar cuidado é para não atingir o direito ou a imagem de uma terceira pessoa, todos os direitos que ela tem inerentes a si.

Algo mudará nesse sentido se o Marco Civil entrar em vigor?

Gisele Arantes - Não, até porque o objetivo do Marco Civil não é proteger as pessoas desse tipo de prática, e, sim, criar os deveres dos provedores de internet, em relação ao fornecimento de informações e coisas afins.

A única coisa que acaba sendo afetada são as questões relacionadas a identificação do usuário que postou algo indevida ou ofensiva na internet.

O Marco Civil vai estabelecer por quanto tempo os servidores devem guardar os dados que possibilitam identificar o mau usuário da rede.

Se você criar um perfil chamando alguém de feio e o alvo da ofensa não souber quem é o autor, ele terá os prazos descritos pelo Marco Civil para descobrir quem criou a comunidade ofensiva.

Nesse caso, a ação também pode ser movida nas esferas cível ou criminal.

Foi algo assim que levou à identificação de internautas que postaram mensagens ofensivas ao Aécio Neves no Twitter durante sua campanha presidencial, não?

Sim, nesse caso o Marco Civil atingiu os direitos das pessoas, que precisam solicitar oficialmente os dados dentro do prazo determinado e que os provedores devem guardá-los.

No caso de provedores de aplicações como Facebook, Twitter, o período é de seis meses.

Já para os provedores de conexão de acesso à internet devem guardar os dados por um ano.

Se você for precisar dos dados dos dois provedores para identificar, por exemplo, o criador de um perfil anônimo, será preciso “correr”, até porque a Justiça é um tanto lenta.

Esse tempo é suficiente mesmo?

Gisele Arantes - Sim, o tempo é suficiente, não se pode deixar para o final do prazo. É preciso reagir rapidamente.

Uma pessoa que sofre qualquer tipo de ofensa na internet vai realmente “correr” para buscar uma solução.

Quanto antes for removida a ofensa, menos ela ficará exposta. Em seis meses a notícia ou a foto terá se espalhado.

Quais outros comportamentos podem gerar processos no Facebook?

Gisele Arantes - O mais comum é o crime de ofensa contra a honra e pedido de danos morais. As pessoas perdem a medida.

Brigam com o namorado e falam mal dele nas redes sociais, esposas traídas que falam mal da amante... Tem até um caso de uma esposa, em São Paulo, que descobriu que a amiga era amante do marido, gravou um vídeo batendo nela e o postou no YouTube.

No final das contas, ela teve que indenizar a amante do marido por ter exposto a pessoa na internet. Ela excedeu o direito dela de liberdade de expressão.

Eu diria que hoje pelo menos 90% dos casos são de ofensa a honra das pessoas. E, claro, os outros crimes são contra pessoa jurídica, funcionários falando mal da empresa, causando demissão por justa causa, ou expondo informações corporativas sigilosas.

Até mesmo o consumidor que fica insatisfeito com um serviço ou produto. Se ele se exceder nos comentários, ele pode ser punido.

Então é possível reclamar, mas só até certo ponto? O que não pode é chegar a difamar a empresa?

Gisele Arantes - Exato. Não pode colocar em xeque a reputação da marca. Ele pode falar que comprou um produto da Coca-Cola que, por exemplo, e veio sem gás.

Pode-se dizer “estou triste com a empresa porque ela deveria cuidar melhor da qualidade dos produtos”.

Agora, se você falar “a Coca-Cola é uma porcaria de empresa sem respeito pelo consumidor” e começar a xingar de forma a desmotivar outras pessoas a comprarem produtos da empresa, você passa a ser punível perante a lei.

A melhor dica é usar a internet com bom senso. Não fomos educados para usar a internet, ela chegou e dominou a vida das pessoas e não deu tempo delas aprenderem a se proteger, aprender a usar a rede de usa forma ética, o que pode ou não pode.

Temos uma educação analógica para trabalhar em um ambiente digital. Imagino que as gerações X e Y foram obrigadas a começar a usar a internet e foram aprendendo conforme as coisas aconteciam.

Hoje é difícil imaginar a vida sem o Google, uma empresa de 16 anos.

Parece que ele estava lá desde que nascemos. Isso tudo é complicado para pessoas que não tiveram a oportunidade de usar a internet, tudo cresce muito rápido no ambiente digital.

Por isso, para nós, é mais do que recomendável o bom senso na hora de apertar o enter.

Fonte: Exame


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