O foco do management convencional, da contratação à avaliação e à remuneração, continua no emprego, não no trabalho. As duas coisas são diferentes e está na hora de mudar o foco
Eduardo, um aluno de MBA da Fundação Getulio Vargas, chegou para conversar comigo ao final de uma aula de marketing interno, na qual tínhamos falado bastante sobre a questão das entrevistas de contratação. Ele me contou que tinha trabalhado durante 10 anos em uma empresa, quando recebeu a proposta de uma concorrente. Num primeiro momento, achou que não deveria ir, porque estava feliz e tinha feito carreira na empresa onde estava trabalhando, apesar de esta ser gerida de uma maneira um pouco verticalizada. Mas isso não chegava a incomodá-lo. Foi mesmo a curiosidade que o levou a ouvir a proposta da concorrente.
Eduardo me contou que uma das primeiras perguntas que o líder da concorrência fez foi “O que você mais gosta de fazer?”. Ele conta que na hora, ficou mudo com a pergunta, porque teve vergonha de dizer que adorava cantar numa banda de rock que tinha fora do trabalho. O fato de “não precisar” necessariamente estar ali, fez com que ele olhasse para o entrevistador, hoje seu líder, e acabasse falando sem milongas: “Ahhh.. eu adoro cantar na minha banda”.
Para a surpresa dele, o entrevistador era o maior incentivador deste tipo de atividade fora da empresa, e a empresa em si tinha uma cultura de ócio criativo, o que fazia com que tudo isso estivesse alinhado muito mais com a pessoa que Eduardo realmente era.
O salário oferecido era quase o mesmo da outra empresa, mas Eduardo não pensou duas vezes antes de mudar. Por quê? Porque na empresa anterior ele estava feliz, mas não podia ser ele mesmo o tempo todo, precisava obedecer ao padrão de comportamento que a empresa o impunha. Na empresa atual, ele é ainda mais feliz, principalmente porque não precisa abrir mão da sua personalidade, e isso gera mais transparência e o faz ter muito mais vontade de ir trabalhar e de fazer acontecer.
Na varejista de eletrônicos Best Buy, dos EUA, muitos funcionários não têm horário de trabalho e nem são obrigados a aparecer no escritório. A única expectativa é que cumpram no prazo tarefas previamente acordadas. Mais radical do que deixar que os funcionários definam como e quando trabalharão é permitir que eles não façam o trabalho. De acordo com o programa 20% do Google, os programadores podem gastar até 20% de seu tempo no escritório com projetos não aprovados.
Os psicólogos empresariais já entenderam há muito tempo que poucos trabalhadores são motivados a ter um desempenho excelente por festas em pizzarias, bônus, almoço com o chefe, prêmio de funcionário do mês ou mesmo a promessa de aumento salarial. O que realmente motiva os profissionais é o trabalho: trabalho interessante, trabalho útil, trabalho desafiador, trabalho cuja realização satisfaz tanto o ego como o lado social de cada um.
Infelizmente, apesar disso, o foco do management convencional, da contratação à avaliação e à remuneração, continua no emprego, não no trabalho. Esse é o problema. As duas coisas são diferentes e está na hora de mudar o foco, ainda que no Brasil a legislação trabalhista ainda seja um entrave para o empregador proporcionar este tipo de inovação.
Daniel Pink, autor do livro Motivação 3.0 (ed. Campus/ Elsevier), explica que os gestores geralmente partem do princípio de que quando o trabalho não é bem feito é porque o funcionário é incapaz ou burro, quando, na verdade, isso se deve mais ao fato de a gestão ter distribuído o trabalho de forma burra.
Ele acredita que uma nova geração de executivos seniores está tomando um novo caminho. "Eles nunca ouviram falar de Taylor e possivelmente não sabem o que são sindicatos e greves. Em geral são homens e mulheres jovens que não são especialistas em gestão de negócios, se é que eles se vêem como pessoas de negócios". Em vez de aplicar o velho modelo das fábricas ao processamento de informações pós-industrial, eles tomam emprestado o modelo dos workshops do século 19 que a Revolução Industrial tentou destruir.
A empresa decide que trabalho precisa ser feito, mas os funcionários, individual ou coletivamente, decidem como melhor fazê-lo, quando fazê-lo e com quem fazê-lo. Empresas jovens tendem mais a experimentar, se não por outra razão, ao menos pelo fato de que o crescimento rápido deixa um vácuo de management. Seria este o novo modelo de liderança eficaz?
Fonte: Administradores
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